sábado, outubro 20, 2007

Timor-Leste: Jaco "redux": helicópteros ISF em santuário natural

Díli, Timor-Leste 17/10/2007 10:57 (LUSA)
Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa

Díli, 17 Out (Lusa) - Dois helicópteros das Forças de Defesa Neozelandesas (NZDF) aterraram e pernoitaram no Ilhéu de Jaco, na ponta leste de Timor, de 12 para 13 de Outubro, contrariando uma antiga tradição respeitada por todos os estranhos à comunidade local de Tutuala.

Jaco, na ponta leste de Timor, é um sítio único: um anel de coral escrevendo um ponto final no grande arquipélago malaio-indonésio, na convergência de dois mares e dois continentes.

Os aparelhos das NZDF, ao serviço das Forças de Estabilização Internacionais (ISF), são dois "Iroquois", ou "HU-1" por nome de série (de onde derivou o seu nome de gíria, "Huey"), o modelo de helicóptero mais fabricado de sempre.

É também a mais cinematográfica das aeronaves. São helicópteros destes que dominam, por exemplo, a tela de "Apocalypse Now".

Sobre o meio-dia de sábado, 13 de Outubro, os dois "Iroquois" do contingente kiwi levantaram da vegetação onde tinham dormido e atravessaram o azul espesso do
Canal de Jaco.

Voaram sobre os pescadores de Tutuala e desapareceram a oeste, em direcção à cordilheira do Mundo Perdido e à estranha pradaria de Iralalaro (uma ilusão de Patagónia).

Vistos de uma canoa no canal, os "Iroquois" pertenciam a um fotograma da "Cavalgada das Valquírias" no filme de Francis Ford Coppola.

Duas diferenças substanciais entre o clássico de Coppola e a realidade de Timor-Leste: em Jaco não há guerra nem há Wagner.

Há uma paisagem e um ecossistema protegidos por regras costumeiras com uma frágil concretização legal.

O ilhéu e recifes envolventes (e tartarugas, e tubarões e raias…) constituem uma das "áreas agrestes" incluídas pela Administração Transitória das Nações Unidas nas áreas protegidas do território.

Jaco é também a jóia do Parque Natural Nino Konis Santana, o primeiro de uma futura rede nacional de parques, criado a 27 de Julho de 2007 pelo anterior governo.

O regulamento que concretiza a resolução do Conselho de Ministros está ainda em elaboração, confirmou a Lusa junto do ex-primeiro-ministro Estanislau da Silva e de técnicos da Direcção de Florestas do ministério da Agricultura.

"Os helicópteros e respectivas tripulações pernoitaram no ilhéu como parte de uma actividade de familiarização e treino de sobrevivência", declarou à Agência Lusa um porta-voz das ISF.

"As ISF não conhecem, nem foram informadas sobre a existência de quaisquer regras específicas para voar/aterrar em Jaco", acrescentou o mesmo porta-voz, numa resposta oficial detalhada às questões enviadas pela Lusa.

"Em conversa com habitantes no Ilhéu de Jaco, não houve referência a tais regras", acrescentou a mesma fonte, sublinhando a necessidade de as ISF "garantirem uma presença em todo o país" e de treinarem as tripulações a sobreviver nas áreas remotas que sobrevoam.

"Na sua missão, as ISF esforçam-se sempre por respeitar as tradições e costumes locais".

Na praia de Tutuala, em frente a Jaco, a Lusa ouviu dos pescadores a surpresa e indignação resumidas numa frase-lei: "Nunca ninguém dorme no ilhéu".

"O ilhéu é um local sagrado e mágico para as populações da ponta leste", explicou à Lusa o presidente do Partido Social Democrata, Mário Viegas Carrascalão, chefe do Serviço de Agricultura no final da colonização portuguesa e ex-governador sob a ocupação indonésia.

Mário Viegas Carrascalão, engenheiro agrónomo, recorda uma missão a Jaco há vinte anos que confirma a estranheza do ilhéu.

"Levei o meu altímetro para medir o ponto mais alto de Jaco, mas no centro do ilhéu o ponteiro indicava uma altitude negativa", contou o ex-governador.

Em 1971, Mário Viegas Carrascalão recebeu ordens do governador português, brigadeiro Valente Pires, para transportar água doce, em canoas, de Tutuala para Jaco.

"A ideia era evitar que os veados que se refugiam em Jaco na estação das chuvas tivessem de nadar de volta para Timor, na estação seca", explica.

"Os pescadores esperavam e chacinavam os veados do lado de Tutuala", recorda.

Além deste "Cervus timorensis", outras espécies raras habitam Jaco.

Fernando Santana, que trabalha no regulamento do Parque Konis Santana, refere a preciosa aitasi, "árvore do mar" ("Cordia subcordata"); o mêda, ou cuscus ("Phalanger orientalis"), um marsupial originário da Nova Guiné, e pelo menos seis espécies de aves que integram a zona de Wallacea.

A Wallacea é uma zona biogeográfica no Sudeste Asiático nomeada em honra de Alfred Russel Wallace, um naturalista britânico do século XIX (1823-1913) que elaborou, com Charles Darwin, a Teoria da Evolução.

A virgindade de Jaco faz do ilhéu um dos últimos locais que pouco mudaram desde a época em que Wallace contou as suas expedições no magnífico "The Malay Archipelago".

Wallace, que esteve em Timor, poderia explicar aos pescadores de Tutuala a verdade científica da mãe-natureza: o éden é um longo filme que evolui por soma de apocalipses.

Jaco é um ilhéu que reproduz à escala pequena a evolução natural de Timor-Leste: depois da era já longínqua de Konis Santana, comandante das Falintil, natural de Tutuala, vem o tempo moderno das ISF.

Sobre os pescadores de Tutuala, as duas "valquírias" kiwis participaram, por isso, de uma discreta expiação da História: os "Iroquois", como todos os helicópteros de guerra americanos, levam o nome de uma das tribos indígenas subjugadas à superioridade militar dos brancos.

Lusa/fim


Nota de Rodapé:

Mais um exemplo dos grandes "respeitadores" das tradições e costumes locais...

1 comentário:

Anónimo disse...

Desculpem que diga, mas JACO é australiano! afinal, Jaco também pertence a Timor-Leste, logo é australiano.

Os australianos é que sabem...

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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