sexta-feira, novembro 16, 2007

Portugal não abandonou Timor em 1975

Lusa - 15 de Novembro de 2007, 18:30

Henrique Botequilha
A revelação do consenso em 1963 de quatro potências anglófonas sobre a integração de Timor-Leste na Indonésia permite rever o comportamento de Portugal na sua ex-colónia asiática, defende um investigador de ciências políticas e relações internacionais da Universidade de Lisboa.

"Ao contrário da tese que se generalizou, Portugal não abandonou Timor-Leste em 1975, porque pouco podia fazer", considera Moisés Silva Fernandes, que estudou documentos recentemente abertos ao público, nos arquivos das diplomacias britânica e australiana.

Vários documentos na posse do especialista demonstram que Austrália, Reino Unido, Estados Unidos da América e Nova Zelândia acordaram secretamente em Washington, em 1963, a integração de Timor-Leste na República Indonésia.

Do ponto de vista histórico, estas revelações "mudam completamente as coisas", diz Moisés Silva Fernandes. "Portugal começou a elaborar em 1974 um plano de descolonização para Timor-Leste", lembra. "Mas os decisores portugueses desconheciam que já existia um consenso ocidental para Timor-Leste desde 1963, nas reuniões secretas de Washinton e para as quais os portugueses não foram convidados nem para um beberete", adianta.

"Se Portugal soubesse deste consenso ocidental e regional, talvez tivesse existido mais cautela nas reuniões que manteve com a Austrália a propósito do plano de descolonização para Timor, porque a Austrália não estava de boa fé", comenta. A Indonésia, nota, também estava ao corrente das iniciativas de descolonização de Timor-Leste, bem como do posicionamento secreto das potências ocidentais.

O acordo secreto dos quatro países anglófonos, em 1963, surgiu num contexto em que "a Holanda estava fortemente pressionada a ceder a Papua Nova Guiné Ocidental à Indonésia", afirma o investigador. "Integrando a população à força e com o beneplácito de várias potências, entre as quais o Reino Unido, os Estados Unidos e a Austrália".

Por outro lado, observa Moisés Silva Fernandes, "também existia o problema da Papua Nova Guiné Oriental, que era uma colónia australiana e que poderia ser reclamada pela Indonésia".
A diplomacia do Reino Unido, no início da década de 60, sente-se, por seu lado, inquieta com o nacionalismo indonésio e, segundo o especialista da Universidade de Lisboa, teme a reacção de Jacarta à criação de "uma grande Malásia", a partir das suas antigas colónias asiáticas.

"Para defender os seus interesses na região, os ingleses precisam do apoio do ocidente", diz Moisés Silva Fernandes", e "lembram-se de fazer uma reunião a quatro (com responsáveis políticos dos Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia)", o que sucede, em dois encontros em Washington, em 1963. Em ambos, participaram altos representantes políticos das diplomacias destes países anglófonos.

No mesmo período, Robert Menzies, primeiro-ministro australiano, e António Oliveira Salazar, chefe do governo português, trocam cartas sobre a questão de Timor-Leste. "Tinham uma excelente relação, Salazar até lhe enviava garrafas de vinho do Porto", adianta o especialista da Universidade de Lisboa.

Mas já então, diz Moisés Silva Fernandes, "estava escrito em Washington que Portugal era o peão a cair", em nome dos interesses das potências ocidentais no sudeste asiático. "Será que a decisão tomada a respeito de Timor-Leste foi o rebuçado que se deu aos indonésios para não criarem problemas na Papua Nova Guiné Oriental", pergunta o investigador.

Doze anos mais tarde, havia novos interesses, como os hidrocarbonetos no Mar de Timor, e num contexto de guerra fria, um movimento como a Fretilin era contrário aos propósitos das potências ocidentais na região, lembra Moisés Silva Fernandes. "Só em Março de 1975 Portugal começa a perceber que a Austrália está a dar apoio à Indonésia a propósito de Timor-Leste".

A Indonésia invadiu Timor-Leste em 07 de Dezembro de 1975, numa data em que a administração portuguesa já não se encontrava na ilha. "Sempre tive muitas dúvidas de que os portugueses fossem culpados por esta situação e que as outras potências saíssem ilesas destes acontecimentos", afirma Moisés Silva Fernandes. "Agora sabemos que estava tudo decidido e escrito muito antes."

"As relações entre Portugal e Austrália sobre Timor-Leste mantêm-se no desconhecimento absoluto", afirma o investigador. "Tenho a certeza de que nos arquivos portugueses e australianos ainda existem coisas que vão deixar as pessoas altamente surpreendidas."

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"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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