sexta-feira, novembro 09, 2007

Timor-Leste: Da resistência ao tribunal, acusados de massacre falam em "injustiça" e "insulto"

Lusa - 08 Novembro 2007, 12:12
Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa

Díli, 08 Nov (Lusa) - Entre os arguidos do massacre de Caicoli estão dois veteranos com 24 anos de resistência no mato. Estão prontos para a prisão mas consideram "uma injustiça e um insulto" responderem, dizem, "por defender o Estado e a nação".

Passa do meio-dia no discreto Bairro do Farol, Díli, domicílio dos titulares timorenses. Doze homens - onze fardas verdes e uma farda azul - saem de um minibus militar à porta da residência do brigadeiro-general Taur Matan Ruak, chefe do Estado-Maior das Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL).

São os arguidos no processo dos oito polícias mortos a 25 de Maio de 2006, em Caicoli, quando militares das F-FDTL dispararam sobre uma coluna da Polícia Nacional (PNTL) sob escolta das Nações Unidas.

"O general", como os militares se referem ao seu comandante, ainda não chegou.

É hora de almoço. O grupo de arguidos está nervosamente bem disposto: à mesa, depois de uma manhã no banco dos réus do Tribunal de Recurso, haverá frustração e incerteza.

O juiz do processo marcou a leitura da sentença para 29 de Novembro.

"Durante 24 anos, lutámos segundo o princípio da independência e da defesa de todo o povo. Sempre foram essas as minhas funções", afirmou à Agência Lusa o segundo-sargento Paulo da Conceição "Maucana".

O militar, natural de Quelicai, Baucau (leste), pertence à escolta pessoal do brigadeiro-general Ruak.

"Estava com ele na manhã do tiroteio, na mesma sala" das antigas instalações da força internacional de paz (PKF), em Caicoli, onde era o comando das F-FDTL, mesmo atrás do quartel-general da PNTL.

"Quando a PNTL disparou para a sala, os estilhaços da janela que havia por cima de mim caíram-me na cabeça", recordou hoje o sargento "Maucana", no alpendre do seu comandante.

"A intenção era matar o general Ruak e o coronel Lere (Anan Timur)", garante o escolta do brigadeiro-general.

"Maucana", que empunha uma M16 no início do filme do tiroteio visionado durante o julgamento, afirmou à Lusa que não disparou sobre a coluna de polícias porque nem sequer saiu da ex-PKF.

"As acusações são falsas. Eu estive no mato e tenho princípios. É um insulto estar a ser tratado como um criminoso", declarou à Lusa.

O sargento "Maucana" traz a braçadeira da Polícia Militar, que, até à crise de 2006, era comandada pelo major Alfredo Reinado.

O grupo do major Reinado atacou elementos das F-FDTL em duas ocasiões. Numa delas, "Maucana" foi ferido num dedo por um estilhaço de granada.

"Talvez tenha sido atacado" pelo seu ex-comandante, evadido de uma prisão de Díli desde 30 de Agosto de 2006.

O sargento "Maucana" carrega outra cicatriz, na perna esquerda, de quando foi atacado pelos indonésios em 1991, "depois de escoltar o comandante Xanana Gusmão para a região de Ainaro".

Também Armindo da Silva "Maukade", a completar 50 anos, fez a vida na resistência e junto dos chefes máximos da guerrilha: era escolta do coronel Lere.

Para o veterano "Maukade", estar no banco dos réus é "estranho".

É, no entanto, um dos três arguidos que admitiu ter disparado "uma rajada" em Caicoli.

"Sou um homem humilde e lutei por todo o povo. Não defendi a minha família, o meu pai ou a minha mulher. Depois da independência, tenho que defender o governo e as F-FDTL", resumiu à Lusa.

"Não vou sair das Forças a não ser que me digam que já não precisam de mim", garante.

Chega, entretanto, o brigadeiro-general Ruak, descontraído. Ao pedido de entrevista da Lusa, aponta para o advogado José Guterres: "Fale com ele!"

O soldado "Maukade" explica que, a 25 de Maio, "não houve uma ordem de cessar-fogo por rádio", mas que "passou de homem em homem uma ordem vinda do comando" para que parassem os tiros.

"Maukade" estava no exterior da ex-PKF "em autodefesa".

Para o mais velho dos arguidos, "houve uma falha das Nações Unidas".

"O cessar-fogo tem que ser coisa clara, com termos definidos. Nós parámos os tiros porque ouvimos que a ONU ia entrar" na PNTL para evacuar os polícias.

"Mas as negociações para cessar-fogo têm que seguir termos e fases bem definidas", o que, segundo "Maukade", não aconteceu.

O soldado insiste também que "a coluna não fez nada para respeitar a bandeira da ONU" e repete que "os polícias foram indisciplinados ao fazer 'manguitos' e a cantar o hino nacional".

O Ministério Público pediu a condenação do soldado "Maukade" e a absolvição, "com algumas dúvidas", do sargento "Maucana".

"Não somos loucos para nos matarmos uns aos outros entre militares e polícias", alega o sargento "Maucana".

"Se for para a prisão, a instituição continuará a cuidar de mim", conclui o veterano "Maukade".

"Estamos prontos para cumprir a lei. E as ordens do comando".

Lusa/fim

4 comentários:

Anónimo disse...

haviam tambem um grupo de civis mal uniformizados que tambem abriram fogo com armas automaticas e semi automaticas a PNTL.
NINGUEM TESTEMUNHA PORQUE TEM MEDO DE PERDER A VIDA.

Anónimo disse...

O cor Reis referiu isso no seu testemunho, sobre os elementos que estavam por detrás do contentor

Anónimo disse...

Então o Cor Reis referiu isso e a Lusa NUNCA contou? Curioso, não é verdade?

Anónimo disse...

Entao esses homens tem tantos principios que atiraram em policias ja completamente desarmadas. se isso nao for crime entao nao ha crime nenhum.nem sei se os Indonesios teriam tido a coragem de fazer isso

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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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