quarta-feira, março 05, 2008

Gastão Salsinha - de insurrecto a facilitador, em 24 horas

Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa, em Díli

Díli, 04 Mar (Lusa) - Ao final de segunda-feira, vários membros do Executivo e altas figuras do Estado timorense esperavam, em pé, à frente do Palácio do Governo, no relvado entre a jovem bandeira nacional e o velho padrão português.

Dizer que os dignitários esperavam supõe a certeza frágil, mas lógica, de que esperavam algo ou alguém. Díli, o país, os timorenses em geral, o Estado, a ONU, todos esperam há dias, "a qualquer momento", "nas próximas horas", a captura ou a rendição de Gastão Salsinha.

O ex-tenente é o líder do grupo que atacou José Ramos-Horta e Xanana Gusmão, depois da morte do major Alfredo Reinado no ataque à residência do Presidente da República.

Em Timor-Leste, como vem recordando a operação "Halibur" de captura de Salsinha e seu grupo, espera-se longamente por aquilo que, sabe-se, acontecerá de súbito.

A imprensa, juntando-se à espera, parecia uma segunda guarda de honra, em torno da segurança apertada do primeiro-ministro, dos ministros, secretários de Estado e assessores, do procurador-geral da República, mais tarde do CEMGFA timorense e do presidente do Tribunal de Recurso.

O ambiente era solene mas descontraído em torno de Xanana Gusmão. Como é seu hábito, o primeiro-ministro fumava.

Era já escuro quando, depois das 19:30, passou frente ao Palácio um cortejo de camiões das Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL). Buzinas, sirenes, ruído alegre: os soldados que enchiam os camiões festejavam algo. De algum canto, por telemóvel, surgiu a "notícia" de que a alegria era pela entrega de Salsinha.

"Vem a caminho", disse um jornalista.

"A operação acabou!", gritou outro.

"A operação não acabou. Não temos conhecimento de que Salsinha se tenha rendido. Se tivesse, o comando conjunto saberia de imediato", informou, minutos depois, uma fonte militar da operação "Halibur".

Já passava das 20:00 quando os VIP no relvado desmobilizaram com apertos de mão, em direcção aos jipes.

"Boas notícias", respondeu Xanana Gusmão, voltando-se para trás, quando a Lusa procurou uma explicação para o que tinha acontecido no relvado.

Quantas são as boas notícias?

"Seis, de momento", respondeu o primeiro-ministro, confirmando a entrega de elementos do grupo fugitivo.

Salsinha vem para Díli?

"Vem. Tu não acreditas no Salsinha?"

De que estiveram à espera estas duas horas?

"Um bocado a respirar ar fresco… O novo ambiente… Troca de impressões".

O Governo e o seu chefe abandonou o relvado. Ficaram os jornalistas, a braços com a "última", surgida também de telemóvel: Salsinha ter-se-ia rendido à igreja, em Gleno, que depois contactou a Polícia Militar (PM).

"É verdade. Está connosco. Foi ter com a família, em Gleno, pelas 16:00. Depois foram juntos à igreja. E o padre contactou-nos. Está tudo sob controlo agora", confirmou à Lusa e à RTP o comandante da PM, major Gino Neves.

"Desconhecimento", "altamente improvável", foram os comentários obtidos de fontes militares da operação "Halibur" e de fontes internacionais.

Ao longo de terça-feira, manteve-se o silêncio oficial em torno da entrega de Gastão Salsinha. Um dado novo, no entanto: tanto fontes timorenses como internacionais, em Díli e em Ermera, repetiram "o bom andamento" dos contactos.

Outro dado: "Graças à imprensa portuguesa e ao comandante da PM, a confusão é total em Gleno", dizia um assessor internacional que acompanha, nas colinas a sudoeste de Díli, as negociações para a rendição de Salsinha.

O "a qualquer momento" sobre a rendição passou, entretanto, a ser perspectivado "nas próximas 48 horas".

"Decorrem ainda negociações. Salsinha concordou em render-se mas está a tentar reunir o restante grupo, espalhado em Ermera", afirmaram à Lusa as mesmas fontes.

"Salsinha está na igreja de Ermera, rodeado pelas F-FDTL", afirmou em privado uma fonte oficial timorense, à hora a que muitos titulares e assessores almoçavam no Hotel Timor.

"Isso é verdade, mas é de ontem", respondeu uma fonte internacional junto de quem a Lusa tentou confirmar a informação.

Ao princípio da tarde, uma conferência de imprensa do Comando Conjunto das F-FDTL e Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) foi cancelada - e uma outra marcada para quarta-feira.

Quase à mesma hora, circulou também por Díli uma nova versão: Salsinha estaria rodeado em Ermera pelas Forças de Estabilização Internacionais (ISF), "que pretendem salvar a face trazendo o grupo para Díli, visto que ainda não capturaram ninguém".

"Estou a ouvir isso pela primeira vez. Deve ser mais um dos rumores. Estou no nosso centro de operações e por aqui não passou nada de um cerco a Salsinha", respondeu um porta-voz australiano das ISF à Lusa.

"De qualquer modo, posso dizer que, se estiver em curso algum processo de negociações, as ISF apoiam a solução pacífica e a via do diálogo", ressalvou o oficial australiano.

"As igrejas de Gleno e Ermera estão vazias", respondeu à Lusa, pouco depois, um oficial da operação "Halibur". "Salsinha não está lá".

"Salsinha não está aqui" foi, também, a resposta do padre Adriano, pároco de Ermera, contactado pela Lusa cerca das 17:00.

"Ninguém fala directamente com Salsinha. Ele está na estrada para Letefoho. Um elemento do grupo de Salsinha negociou ontem com o major Neves. Mas não há decisão ainda. É muito difícil".

E sobre a rendição, confirmada segunda-feira pelo comandante da PM?

"Não é verdade", resumiu o padre.

Horas depois, já noite, o Conselho de Ministros divulgou um comunicado em que o pároco é citado naquilo que não quis revelar ao telefone.

"Gastão Salsinha anunciou hoje, através do padre Adriano, pároco de Ermera, que está disposto a entregar-se às autoridades nas próximas horas, juntamente com os seus homens, que se encontravam dispersos e que neste momento tenta agrupar", lê-se no comunicado do governo.

O comunicado adianta também que Salsinha pediu a suspensão da operação "Halibur" em Ermera.

"Não é verdade. As operações continuam. Não íamos arriscar deixar fugir, depois de o termos localizado e cercado, alguém que não mostrou seriedade durante dois anos", afirmou uma fonte da "Halibur".

"A operação só acabará quando forem recuperadas as 38 armas que estão em poder do antigo grupo de Reinado", resumiu a mesma fonte.

"O assunto de Salsinha está resolvido. Ele ainda não veio para 'baixo' porque ele está a negociar, com conhecimento das F-FDTL e do Governo, a rendição do grupo", concluiu, hoje à noite, uma fonte internacional em Díli.

"Virá, decerto, antes do final da semana", disse ainda uma fonte militar.

A todos, como a Xanana Gusmão no relvado, resta esperar.

Lusa/fim


NOTA DE RODAPÉ:

Bravo, PRM. Hilariante.

Mas infelizmente é esta a realidade de hoje em Timor-Leste... Tudo parece uma anedota.

1 comentário:

Anónimo disse...

De facto, isto é anedótico!ANTÓNIO BANDERAS, que tal aproveitar o argumento para uma telenovela de gosto Ásio-Mexicano e deixar o filme do Balibó's Five???

Fítun Taci

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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