quarta-feira, maio 21, 2008

MENSAGEM À NAÇÃO DE SUA EXCELÊNCIA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Presidência da República
MENSAGEM À NAÇÃO DE SUA EXCELÊNCIA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
DR. JOSÉ RAMOS-HORTA
POR OCASIÃO DO 6º ANIVERSÁRIO
DA RESTAURAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA
20 DE MAIO DE 2008

Exmo. Senhor Presidente do Parlamento Nacional
Exmo. Senhor Primeiro-Ministro
Exmo. Senhor Presidente do Tribunal de Recurso
Exmo. Senhor ex-Presidente da República Democrática de Timor-Leste, Francisco Xavier do Amaral,
Exmo. Senhor ex-Presidente do Parlamento Nacional Francisco Guterres Lu’Olo
Exmo. Senhor ex-Primeiro-Ministro Dr. Mari Alkatiri
Exmo. Senhor ex-Primeiro-Ministro Eng. Estanislau da Silva
Exmo. Senhor Procurador-Geral da República
Exmo. Senhor Chefe do Estado-Maior-General das F-FDTL
Exmo. Senhor Comandante-Geral da PNTL a.i.
Exmas. Senhoras e Senhores Deputados
Exmas. Senhoras e Senhores Membros do Governo
Exmos. Membros de Autoridades Civis e Religiosas
Exmo. Senhor Representante Especial do Secretário-Geral da ONU, Dr. Atul Khare
Exmos. Membros do Corpo Diplomático e Consular,
Exma. Senhora Ministra da Defesa Nacional de Cabo Verde, Dra. Maria Cristina Fontes Lima
Exmo. Senhor Ministro da Defesa Nacional da Guiné-Bissau, Senhor Marciano Silva Barbeiro
Exmo. Senhor Vice-Ministro da Defesa Nacional de Moçambique, Senhor Agostinho Mondlane
Exmo. Senhor Secretário da Aviação Civil do Ministério da Defesa do Brasil, Tenente Brigadeiro do Ar Jorge Godinho Barreto Nery
Exmo. Senhor Director-Geral de Políticas de Defesa Nacional de Portugal, Dr. Paulo Viseu Pinheiro
Exmo. Senhor Secretário Executivo da CPLP, Embaixador Luís Fonseca
Exmas. Senhoras e Senhores Convidados,
Povo de Timor-Leste,


Excelências,

Celebramos hoje a data do sexto aniversário da restauração da nossa independência que traduz um marco fundamental na afirmação e busca da paz e do bem-estar para todos os timorenses.
Os 24 anos de árdua luta de libertação nacional, após a declaração da nossa independência em 1975, culminam com a restauração da nossa independência que sabiamente conquistámos.

Todos nós devemos esta honra aos nossos heróicos irmãos e irmãs que com espírito de muito sacrifício e patriotismo souberam pautar-se para a dignificação e edificação da nossa soberania.

Neste momento de celebração, devemos homenagear os obreiros da nossa luta que, voluntária e incondicionalmente, deram as suas vidas para hoje sermos homens e mulheres livres usufruindo da merecida soberania conquistada com o martírio e a vida de muitos milhares de timorenses.

Os seus nomes foram, são e serão referências da nossa História e memória viva da nossa existência, pois é graça ao amor deles por Timor-Leste e o desejo de mudar a situação do nosso país que nos encontramos aqui presentes para celebrar a nossa liberdade.

Hoje quero homenagear esses grandes filhos da nossa pátria amada, nomeadamente o Presidente Nicolau Lobato, António Carvarino “Mau Lear”, Vicente Reis “Sahe”, Hélio Pina “Mau Kruma”, Juvenal Inácio “Sera Key”, Guido Valadares, Hamis Bassarewan, Mau Laka, Eduardo dos Anjos, Fernando Carmo, Domingos Ribeiro, David Alex, Isabel Lobato, Guido Soares, Hermenegildo Alves, Rosa Muki Bonaparte, Maria Tapo, Soimali Boavida, Nino Koni Santana, Kilik Uaigai, Mau Hodu Ran-Kdalak, Nuno Horta, meu irmão, Saba Lae, o poeta Francisco Borja da Costa, Afonso Redentor de Araújo, o comandante Aquiles, para citar que alguns nomes, bem como a todos os outros irmãos e irmãs que tombaram pelo dia de hoje, eternamente vos seremos reconhecidos pelo exemplo de coragem e determinação que nos souberam legar.

Também quero, em nome de todos nós, louvar o mesmo sacrifício e coragem dos nossos irmãos e irmãs que durante esses 24 anos permaneceram nas montanhas, muitos deles aqui presentes, como o Gen. Taur Matan Ruak e os oficiais do seu Estado-Maior que combateram durante 24 anos – graças aos quais somos hoje um país livre e independente – e, em especial, ao “Maun Bo’ot”, Xanana Gusmão, pela forma distinta e singular como soube liderar a nossa luta, após a queda das bases de apoio quando mais de 90% dos membros do Comité Central foram mortos em 1978/79.

Xanana e Ma Huno, únicos sobreviventes do Comité Central na época, percorreram o país de lés-a-lés, com o objectivo de reorganizar a resistência. Eleito líder, é nomeado Comissário Político Nacional e, com o apoio de Ma Huno e Mau Hodu, lidera uma resistência difícil, mas sabiamente a faz crescer de ano a ano, com o importante apoio da Igreja Católica.

Em Novembro de 1992, Xanana é capturado, julgado e preso em Cipinang. Mesmo a partir da sua cela, continua a orientar as três frentes da nossa resistência, ou seja, a frente armada, clandestina e diplomática.

Deste modo, Xanana Gusmão provou ser um líder incontestável da resistência de Timor-Leste. Esta sua herança é eterna e nos inspira no nosso dia-a-dia.

Também quero louvar a Igreja Católica pela sua contribuição durante o período da luta de libertação. O seu papel foi fundamental durante esse período difícil, através dos seus ensinamentos de solidariedade humana, dos valores éticos e morais. A Igreja Católica, à qual a identidade timorense está intimamente ligada, merecerá eternamente o nosso apreço e respeito.

Não posso deixar de agradecer à comunidade internacional pela forma como nos apoiaram durante esse período, especialmente os países de expressão de língua portuguesa.

Os países irmãos que hoje com Timor-Leste constituem a CPLP, situam-se entre os poucos países que desde a primeira hora batalharam connosco na trincheira diplomática pelo respeito ao nosso direito sagrado à livre auto-determinação.

Caros compatriotas,
Senhoras e senhores,

Duma análise retrospectiva sobre a caminhada que fizemos, o patamar onde hoje nos encontramos só nos deve orgulhar pelo percurso feito e pelos inúmeros obstáculos que, entretanto, conseguimos superar.

A quantidade dos desafios superados confere outro significado aos ganhos conseguidos, que devem fortalecer a auto-estima da nossa Nação, estimulando-a a encarar os desafios do futuro com confiança acrescida, lucidez e coragem.

É importante termos o sentido da vida e da história. Cada homem deve ter o sentido da vida e cada povo o sentido da história. Termos o sentido de que estamos a construir o futuro e de que só nós podemos construir esse futuro. Não podemos viver só o presente, temos de ser capazes de projectar o amanhã.

De 2002 até hoje muitos sucessos foram alcançados. Exemplo vivo desse sucesso é a reconhecida boa gestão macroeconómica e fiscal que permitiu minimizar a crise de 2006 em termos socio-económicos. Para tal, basta lembrarmo-nos de como o Governo, com o apoio generoso da comunidade internacional, conseguiu responder às necessidades imediatas de mais de 100 mil deslocados durante esse período.

Ainda na minha qualidade de 1º Ministro, tive noção clara do funcionamento das instituições e da necessidade de as reformar. Mas, também tive a consciência de que a reforma deve ser feita dentro do processo da evolução permanente e contínua de modo a não provocar quebras e desmantelamentos.

Por outro lado, devemos reconhecer o sucesso da negociação sobre o petróleo que culminou com o Tratado do Mar de Timor e a criação do fundo de petróleo, instituição reconhecida internacionalmente como uma das melhores no mundo.

Neste momento, temos no Fundo do Petróleo quase 3 mil milhões de dólares americanos que podem ser utilizados pelo actual Governo, sem que para tal haja necessidade de alterar a lei em vigor, contanto que o Governo demonstre a sua capacidade em realizar uma boa gestão e execução orçamental, e apresente planos e programas convincentes às instituições competentes.

Neste sentido, repito a afirmação que fiz no Parlamento Nacional no mês passado, a saber: “a grande crise financeira e alimentar mundial que vivemos, associada à subida do preço dos combustíveis e dos alimentos de primeira necessidade, está a afectar milhões de pessoas em todo o Mundo e, em Timor-Leste, ameaçam agravar perigosamente os índices de pobreza, se nada for feito para mudar a situação.”

Esta constatação leva-me a formular a seguinte pergunta: “quais são as alternativas que um pequeno país como o nosso pode preconizar para minimizar o impacto desta crise, criar um ambiente favorável ao desenvolvimento económico e proteger os mais desfavorecidos?”

A nossa Constituição consagra a obrigação do Estado em garantir o direito à segurança social de todos os cidadãos. Esta obrigação, por si só, e caso necessário, permite o recurso ao fundo petrolífero de modo a criar as condições de segurança tão necessárias à criação de postos de trabalho como consequente meio de rendimento para os nossos concidadãos.

Timor-Leste ainda é um país que carece de estradas, infra-estruturas, acesso a tecnologias, investigação e investimento agrícola, um bom sistema de crédito e comercialização, entre outros.

O Governo deve continuar a intensificar os programas de apoio aos agricultores com fertilizantes e boas sementes, de modo a aumentar a nossa produção agrícola, contribuir para melhorar a dieta alimentar, fomentar a formação profissional e profissionalizante de que o país tanto carece.

Neste apelo que lanço à luta contra a pobreza, é importante a conjugação de esforços de todas as forças vivas da nação, desde as instituições do Estado, aos partidos políticos, a sociedade civil, a comunidade internacional, e as confissões religiosas, para que conjuntamente possamos encontrar e desenvolver um clima de paz e prosperidade de que todos nós deveremos beneficiar.

O combate à pobreza e o reforço da coesão nacional e social são duas faces do mesmo dever do Estado timorense – promover o desenvolvimento da nossa sociedade e consolidar as instituições.

Caros compatriotas,
Senhoras e Senhores,

Os eventos de 11 de Fevereiro são provas evidentes da fragilidade do nosso Estado. Não obstante esta constatação, quero louvar as F-FDTL e a PNTL pelos bons serviços prestados à Nação.

Ao General Taur Matan Ruak e, através dele, a todos os oficiais e efectivos das Forças de Defesa, uma palavra de parabéns do Comandante Supremo das Forças Armadas.

Para a PNTL, através do seu comandante-geral interino Afonso de Jesus, igualmente as minhas felicitações a todos os efectivos policiais.

Mais uma vez apelo às duas forças para que nunca mais haja desconfianças entre si e falsas divisões. As F-FDTL e a PNTL são forças nacionais, com o dever de defender a Pátria e todo o povo. Não devem cair na teia daqueles que as querem dividir para desestabilizarem a nossa nação.

Deixo também o meu reconhecimento ao Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, Sua Excelência Sr. Atul Khare, e, através dele, o meu apreço aos efectivos da UNPOL, bem como a todas as agências que integram a organização que representa.
Ao Governo da Austrália e da Nova Zelândia registo, uma vez mais, os meus mais sinceros agradecimentos pela presença em Timor-Leste dos seus homens e mulheres, das Forças Armadas, cuja contribuição para a estabilidade do nosso país tem sido notável.

Do mesmo modo, agradeço também ao Governo da Malásia e de Portugal pela contribuição das suas forças policiais na reposição da ordem pública no nosso país, após a crise de 2006.

Além dos problemas relacionados directamente com a segurança, Timor-Leste tem à sua frente outros desafios importantes.

O mais urgente é a condição dos deslocados internos que o Governo está a resolver de forma muito positiva com o apoio da sociedade civil e Igreja.
Outro desafio importante é a questão dos peticionários que, neste momento também, está a ser resolvida pelo Governo com sucesso, embora as causas do problema ainda estejam por solucionar.

Dum olhar atento à situação da nossa juventude observamos a falta de medidas suplementares nas alocações orçamentais do Estado para este sector, desde o 1º Governo até ao 4º Governo Constitucional, para responder às necessidades e expectativas desta significativa componente da nossa sociedade.
A nossa juventude precisa de mais apoio do Governo nos sectores da educação, desporto, formação, cultura e trabalho. Devemos tudo isso aos jovens e é possível realizarmos esses objectivos.

Caros compatriotas,
Senhoras e senhores,

Timor-Leste é um pequeno e jovem Estado soberano hoje inserido na sociedade das nações. Por isso, as questões internas do país encontram-se intrinsecamente ligadas às questões internacionais. Enquanto jovem democracia, queremos distinguir-nos por uma cultura de tolerância e promover a unidade na diversidade, impulsionando uma verdadeira cultura democrática.
Neste contexto, temos vindo a ampliar e a consolidar relações de cooperação com vários países do mundo, com especial atenção ao contexto regional. A adesão à ASEAN é uma prioridade do nosso Estado, porque consideramos de vital importância pertencer a esta “família” e extrair as implícitas vantagens que dela derivam: segurança, estabilidade, desenvolvimento económico e cooperação regional.

Quero agradecer, em nome do Povo Timorense, a todos as mulheres e homens, civis e militares das Nações Unidas, que, desde Setembro de 1999 até então, têm estado a prestar um grande contributo ao processo de garantir a paz e a estabilidade no nosso país. A todos vós, dos mais variados e longínquos países, que serviram e servem a organização, durante todos estes anos, um abraço de muita amizade e de gratidão de todo o nosso humilde povo.

O nosso povo pobre e humilde, mas genuíno e intrinsecamente generoso, numa solidariedade manifestada, aliás, aquando do tsunami na região, vai de novo manifestar a sua generosidade para com o povo de Myanmar pelo trágico evento de que foram vítimas. O Governo, em nome do povo timorense, vai, ainda que modestamente, contribuir para ajudar os mais necessitados dessa catástrofe natural.

A China, onde brevemente se realizarão os Jogos Olímpicos, acaba também de ser vítima dum violento abalo sísmico que dizimou milhares de vidas. Em nome do Povo Timorense, bem como em meu nome pessoal, quero expressar as nossas condolências aos familiares das vítimas desta catástrofe e manifestar a solidariedade para com o Povo e Governo Chinês.

Por ocasião dos Jogos Olímpicos, Timor-Leste será representado pelos nossos atletas e, na qualidade de Chefe do Estado, estarei presente nesse grandioso evento.

É ainda importante relembrar que o desporto não só fortalece o corpo como também beneficia o espírito para uma óbvia paz e unidade nacional.
Neste sentido, o Estado deve atribuir maior atenção ao desporto e à cultura.

Caros compatriotas,
Senhoras e senhores,

Para concluir, quero relançar o desafio já formulado a todas as forças políticas para o diálogo e para o entendimento. Estou convicto de que é possível construirmos a paz à volta das prioridades mais importantes do país e cultivar o entendimento político para afastarmos de nós a pobreza.

Acreditarmos em nós mesmos, no melhor que cada um tem dentro de si próprio, é afinal o verdadeiro desafio. Amar o nosso país não é nenhum pecado; a afirmação da nossa identidade não é a negação da identidade de qualquer outra, é tão só a afirmação do direito de existir para se relacionar, em pé de igualdade, com os outros. É isso que justifica a existência do Estado de Timor-Leste.

Apesar dos retrocessos que têm condicionado o desenvolvimento sustentável do nosso país, considero que Timor-Leste tem todo o potencial para ser um Estado com sucesso e ser motivo de orgulho para todos nós, bem como para aqueles que nos apoiam e acreditam em nós.

Finalmente, para celebrar a Fé e renovar a Esperança nos Timorenses, declaro oficialmente hoje, o dia em que foi restaurada a nossa independência, dia 20 de Maio, como o Dia Nacional do Perdão e da Clemência entre os timorenses.
Saber perdoar é uma virtude que nós precisamos de cultivar no nosso coração, bem como sermos humildes e estarmos atentos aos sentimentos dos nossos irmãos.

Conto, com o mesmo espírito de sacrifício que orientou os fundadores da nossa merecida liberdade, com todas as minhas irmãs e irmãos, incluindo os que se encontram na diáspora, na reconstrução da Paz e do Desenvolvimento da nossa Pátria amada Timor-Leste.
Que o Senhor Todo-Poderoso e Todo Bondoso nos abençoe!

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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