sábado, fevereiro 02, 2008

Dos leitores

Comentário na sua mensagem "Timor-Leste: Memória do trauma em exposição sobre ...":

Será que foi em nome dos cerca de 10 mil ex-prisioneiros referidos nesta notícia que o Primeiro-Ministro foi ao funeral do Suharto agradecer o que ele fez por Timor?

Será que ele perguntou a um só destes ex-prisioneiros se deveria ir ou não?

Será, por exemplo, que ele perguntou à Ondina quantas marcas de queimadura de cigarro tem no corpo para saber quantos Padres-Nossos deveria rezar pela alma do Suharto?

Chocante! No mínimo...

No máximo foi uma cuspidela na cara de cada um destes ex-prisioneiros.

Timor-Leste: Memória do trauma em exposição sobre ex-prisioneiros políticos

Díli, 01 Fev (Lusa) - O edifício da antiga prisão portuguesa e indonésia de Balide, em Díli, acolhe este fim-de-semana uma exposição dedicada aos ex-prisioneiros políticos de Timor-Leste entre 1975 e 1999.

A exposição é organizada pela Associação Memória Viva, que se dedica à recolha de material sobre os prisioneiros timorenses sob a ocupação indonésia de Timor-Leste.

Filmes e fotografias serão exibidos sábado e domingo na antiga prisão da Comarca, nome por que ainda é conhecido o edifício da época colonial portuguesa que acolheu, depois de 1975, o maior número de prisioneiros políticos.

Foi neste edifício que funcionou a Comissão de Acolhimento Verdade e Reconciliação (CAVR) timorense e onde está instalado o arquivo resultante das investigações e audiências sobre os anos de ocupação.

"Os ex-prisioneiros políticos ainda não foram reconhecidos como um grupo na luta pela independência", afirmou à Agência Lusa a jornalista australiana Jill Jolliffe, coordenadora da Memória Viva.

"Como grupo, continuam a ser vítimas de exclusão", explicou a jornalista, conhecida pelo seu acompanhamento militante da situação de Timor-Leste desde o início da ocupação indonésia.

"Os que sempre foram continuam a sofrer", resumiu Maria da Silva Benfica sobre a situação dos ex-prisioneiros após a independência de Timor-Leste.

"Ao contrário dos veteranos, os ex-prisioneiros nunca têm uma porta aberta", acrescentou Maria da Silva Benfica, uma das colaboradoras da Memória Viva.

Maria da Silva Benfica foi presa, interrogada e torturada pelos indonésios em 1977, primeiro no edifício Sang Tai Ho, no centro da capital, e depois na Comarca.

Ao todo, cerca de 10 mil timorenses passaram pelo cárcere durante a ocupação (1975-199), em prisões em Timor-Leste ou na Indonésia, adiantou Jill Jolliffe, que há vários anos estuda o percurso dos ex-prisioneiros.

A maior parte desses prisioneiros sofreram alguma forma de tortura, acrescentou Jill Jolliffe.

"É um número impressionante, sobretudo se pensarmos no universo de pessoas afectadas", considerando as famílias alargadas timorenses, frisou.

Jill Jolliffe refere, a propósito, as conclusões perturbantes de um estudo feito durante o período de transição após o referendo pela independência.

Os dados disponíveis apontam para 75 por cento dos lares timorenses com um familiar vítima de tortura e para 34 por cento da população sofrendo formas de stress pós-traumático.

Esta herança de dor, sublinhou Jill Jolliffe, nunca foi enfrentada nem tratada.

"Sem cura não pode existir democracia", resume a jornalista australiana.

Jill Jolliffe acredita que a extensão do trauma é um dos factores que contribui para a erupção actual da violência e uma das causas da crise de 2006.

"A violência irracional desde 1999 tem muito a ver com o stress pós-traumático e com coisas que estão por curar", defendeu Jill Jolliffe.

"A violência política reproduz-se na violência doméstica e é transmitida à nova geração", salientou a jornalista.

"É também preciso considerar que existe uma geração de timorenses que nunca viveu numa sociedade com lei e ordem", acrescentou.

A Associação Memória Viva já registou 52 testemunhos de ex-prisioneiros em filme, 11 dos quais estão editados e cerca de 40 transcritos para português, a língua de trabalho do projecto.

"O produto final deve ser uma pequena colecção ou arquivo sobre os ex-prisioneiros. Mas isso depende de apoios que ainda não existem", afirmou Jill Jolliffe.

"Chegou a altura de os ex-prisioneiros terem alívio prático e a homenagem devida", disse ainda a jornalista.

PRM

Lusa/Fim

The nation builder

SMH.com.au
February 2, 2008

Australia's postwar history would have been very different but for the former Indonesian president, writes former prime minister Paul Keating.

The death of Soeharto, the former president of Indonesia, gives all Australians a chance to assess the value of his life and the relationship between Indonesia and Australia.

More than any figure in the post-Second World War period, including any American president, Soeharto, by his judgment, goodwill and good sense, had the greatest positive impact on Australia's strategic environment and, hence, on its history.

In the 40 years since he came to power in 1965, Indonesia has been the ballast in South-East Asian stability and the foundation stone upon which ASEAN was built.

Soeharto took a nation of 120 million people, racked by political turmoil and poverty, from near-disintegration to the orderly, ordered and prosperous state that it is today.

In 1965, countries such as Nigeria and Zimbabwe were in the same position as Indonesia then. Today, those countries are economic and social wrecks. By contrast, Indonesia is a model of harmony, cohesion and progress. And the principal reason for that is Soeharto.

We can only imagine what Australia's strategic position would be like if Indonesia's 230 million people degenerated into a fractured, lawless state reminiscent of Nigeria or Zimbabwe.

For the past 40 years, we have been spending roughly 2 per cent of gross domestic product on defence - about $20 billion a year in today's dollars. The figure would be more like seven to eight times that, about $150 billion today, if Indonesia had become a fractured, politically stricken state.

Had Soeharto's New Order government not displaced the Soekarno government and the massive PKI communist party, the postwar history of Australia would have been completely different. A communist-dominated Indonesia would have destabilised Australia and all of South-East Asia.

So why have Australians regarded Indonesia so suspiciously, especially over the past quarter-century, when it is evident that Indonesia has been at the fulcrum of our strategic stability?
Unfortunately, I think the answer is East Timor and the wilful reporting of Indonesian affairs in Australia by the Australian media.

That media have, in the main, been the Fairfax press and the ABC. Most particularly The Sydney Morning Herald and to a lesser extent The Age.

This rancour, and the misrepresentation of the true state of Indonesian social and economic life, can be attributed to the "get square" policy of the media in Australia for the deaths of the Balibo Five - the five Australian-based journalists who were encouraged to report from a war zone by their irresponsible proprietors and who were shot and killed by the Indonesian military in East Timor.

This event was sheeted back to Soeharto by journalists of the broadsheet press. From that moment, in their eyes, Soeharto became a cruel and intolerant repressor whose life's work in saving Indonesia from destruction was to be viewed only through the prism of East Timor.

Rarely did journalists mention that Soeharto was president for almost 10 years before he did anything about East Timor. He was happy to leave the poverty-stricken and neglected enclave in his archipelago to Portugal, with its 300-year history of hopeless colonisation. Soeharto had enough trouble dragging Indonesia from poverty without needing to tack on another backward province.

But in mid-1975, communist-allied military officers took control in Portugal and its colonies abroad were taken over by avowedly Marxist regimes. In East Timor, a leftist group calling itself the Revolutionary Front for the Liberation of East Timor, or Fretilin, staged a coup igniting a civil war.

When Fretilin overran the colony by force, Soeharto's government became alarmed. This happened at the height of the Cold War. Saigon had fallen in April of that year. Fretilin appealed to China and Vietnam for help. Fearing a "Cuba on his doorstep", Soeharto reluctantly decided on military intervention. In his 33 years as leader, he embarked upon no other "foreign" exploit. And he would not have bothered with Timor, had Fretilin not made the going too rough. Indeed, Jose Ramos-Horta told the Herald in 1996 that "the immaturity, irresponsibility and bad judgment of the East Timorese provoked Indonesia into doing what it did". Xanana Gusmao also told anyone who would listen that it had been a "bad mistake" for Fretilin to present itself as a "Marxist" outfit in 1975.

But none of this stopped a phalanx of Australian journalists, mostly from the Fairfax stable and the ABC's Four Corners, from reporting Indonesian affairs from that time such that Australians could only view the great economic transformation of Indonesia and the alleviation of its poverty and its tolerance primarily through the warped and shattered prism of East Timor.

The Herald even editorialised in favour of an Australian invasion of East Timor, then Indonesian territory. That is, right up front about it, the Herald urged the Australian government to invade Indonesia. So rabid has Fairfax been about Indonesia and so recreant of Australia's national interest has it been.

Even as late as this week, the Herald claimed the achievements of Soeharto's New Order government "were built on sand", nominating Indonesia reeling from crisis to crisis after 1998, when the Herald knows that Soeharto did precisely the right thing in calling the International Monetary Fund in to help and that the IMF, operating under US Treasury prescriptions, kicked the country and Soeharto to pieces.

The decline in Indonesia, after 30 years of 7 per cent compound growth under Soeharto, had little to do with Soeharto and everything to do with the Asian financial crisis and the short-sighted and ill-informed IMF.

But more than that, Australian journalists knew but failed to effectively communicate that not only did Soeharto hold his country together, he insisted that Indonesia be a secular state; that is, a Muslim country but not an Islamic or fundamentalist one. In other words, not an Iran.

Wouldn't you imagine that such an issue would be matter of high and primary importance to communicate to the Australian community? That on our doorstep there is a secular Indonesian state and not a religious one, run by Islamic law. And wouldn't you, in all reasonableness, give Soeharto full marks for keeping that vast archipelago as a civil society unrepressed by fundamentalism?

Look what happened to us in Bali at the hands of a handful, literally a handful, of Islamic fundamentalists. Imagine the turmoil for Australia if the whole 230 million of Indonesia had a fundamentalist objection to us. But this jaded bunch of Australian journalists could only report how Soeharto was corrupt because his son Tommy, might have elbowed his way into some carried equity with an American telephone company or his daughter something with a road builder. True as those generalisations might have been, in terms of the weight of Australia's interests, the deeds of Soeharto's public life massively outweigh anything in his private affairs.

I got to know Soeharto quite well. He was clever and utterly decisive and had a kind view of Australia. The peace and order of his country, its religious and ethnic tolerance and the peace and the order of South-East Asia came from his goodwill towards neighbouring states and from his wisdom. He was self-effacing and shy to a fault. One had to tease him out of himself to get him going, but once got going, his intellectualism took over.

Soeharto lived in what we would call in Australia a rather old and shabby McMansion in Jakarta. I have been there on a number of occasions. He lived as simply as anyone of his high standing could live.

But Time magazine claimed that Soeharto had stashed away $30 billion-odd, as if those ning-nongs would know, presumably so he could race off to live it up in Miami or the Bahamas. Errant nonsense. Soeharto was an Indonesian who was always going to remain an Indonesian. He lived a simple life and could never have changed that.

I do not doubt that his rapacious family had the better of him and got away with lumps of capital they had not earned. Soeharto was a disciplined leader, but not a disciplined father. But to compare him with the likes of Marcos is nothing short of dastardly.

The descriptions of Soeharto as a brutal dictator living a corrupt high life at the expense of his people and running an expansionist military regime are untrue. Even Soeharto's annexation of East Timor was not expansionist. It had everything to do with national security and nothing to do with territory.

Like all leaders, Soeharto had his failings. His greatest failing was to underestimate the nature of the society he had nurtured. As his economic stewardship led to food sufficiency, education, health and declines in infant mortality, so those changes gave rise to a middle class as incomes rose. Soeharto should have let political representation grow as incomes grew. But he distrusted the political classes. He believed they would not put the national interest first, had no administrative ability and were utterly indecisive, if not corrupt. He told me this on a number of occasions. He would not let the reins go. Partly because he did not want to lose them, partly because he really had no one to give them to.

Soeharto's problem was he had too little faith in his own people, the very people he cared for most.

Whatever political transition he may have wished to have had, it all blew up on him with the Asian financial crisis of 1997-98. He had no democratic transition in place and, in the economic chaos, political forces wanted him to go.

In January 1998, nearly two years after I had left the prime ministership of Australia, I flew to Jakarta on my own initiative and at my own expense to see him the day he signed the IMF agreement with the fund's managing director, Michel Camdessus.

The IMF had tragically overplayed its hand the previous November and Soeharto was giving it a chance to dig itself out of a hole. He had a small window of opportunity. I thought that as a former head of government who was on friendly terms with him, I at least owed him advice of a kind I knew he would never get inside Indonesia: to take the opportunity of the IMF interregnum to say that he, Soeharto, would contest the next election but that he would not complete the term. That he would stay long enough to see the IMF reforms into place and then hand the presidency over to his vice-president.

Had he taken this advice, the process of political transformation would have been completely orderly. And a new administration could have set up the organs of democracy.

I discussed this issue with Singapore's Lee Kuan Yew and Goh Chok Tong, both of whom had Soeharto's and Indonesia's best interests at heart. Both gentlemen believed that I was in a better position to broach this subject with Soeharto than either of them. For two hours I had the president in his house with his state secretary, Moerdiano, and his interpreter Widodo. Fifteen minutes into the conversation, when I was making the case for him to step down, he stopped Widodo's translation and took my advice directly, in English. Moerdiano said to me in an aside at the door, "I think you have got him".

Soeharto followed me to the door, put his arms around my shoulders and said "God bless you" as I left. As it turned out, I didn't quite have him, and he hung on thinking he could slip through one more time.

But the crisis and the behaviour of the IMF and the US Treasury had marooned him.

Completely determined to act constitutionally, he turned over his singular power, at his own initiative, to his vice-president to avoid any upheaval of the kind Indonesia had experienced during earlier transitions.

The new president, B.J. Habibie, then, by all due process, picked up the reins of government to deal with the continuing financial reconstruction and the long process of democratisation.

When the acting Foreign Minister, Robert McClelland, and I arrived in Indonesia for Soeharto's funeral last Monday, we drove the 30-odd kilometres from the airport at Solo to the mausoleum where he would be buried alongside his wife. For not one metre of those 30-odd kilometres, was there no person present. In some places they were six and eight deep, all holding their baskets of petals to throw at his cortege. They all knew they were burying the builder of their society and all felt the moment.

How many Australian leaders would have a million or so people to grieve for them beside the roadway? Soeharto's funeral was a tribute to what his life truly meant. I felt honoured to have been there but more than that, to have known him.

Paul Keating was prime minister of Australia from 1991 to 1996.


Tradução:

O construtor da nação

SMH.com.au
Fevereiro 2, 2008

A história pós-guerra da Austrália teria sido muito diferente não fosse o antigo presidente Indonésio, escreve o antigo primeiro-ministro Paul Keating.

A morte de Soeharto, o antigo presidente da Indonésia, dá a todos os Australianos uma oportunidade para avaliarem o valor da sua vida e as relações entre a Indonésia e a Austrália.
Mais do que qualquer outra figura após o período da Segunda Guerra Mundial, incluindo qualquer presidente Americano, Soeharto, pelo seu raciocínio, boa-vontade e bom senso, teve o impacto mais positivo no ambiente estratégico da Austrália e por isso na sua história.
Nos 40 anos desde que subiu ao poder em1965, a Indonésia tem sido o lastro da estabilidade do Sudeste Asiático e a pedra de toque sobre a qual foi construída a ASEAN.


Soeharto pegou numa nação de 120 milhões de pessoas, mergulhada num turbilhão política e na pobreza, da quase desintegração para o Estado ordeiro, ordenado e próspero que hoje é.
Em 1965, países como a Nigéria e o Zimbabwe estavam na mesma posição que estava então a Indonésia. Hoje, esses países são ruínas económicas e sociais. Por contraste, a Indonésia é um modelo de harmonia, coesão e progresso. E a principal razão para isso é Soeharto.


Só podemos imaginar qual seria hoje a posição estratégica da Austrália se a Indonésia de 230 milhões de pessoas tivesse degenerado num estado partido, sem lei, reminiscente da Nigéria ou Zimbabwe.

Nos últimos 40 anos, temos gasto à volta de cerca de 2 por cento do produto interno bruto em defesa – cerca de $20 biliões por ano no dólar de hoje. Esse número teria sido sete ou oito vezes mais do que isso, cerca de $150 biliões hoje, se a Indonésia se tivesse tornado num Estado fracturado, políticamente ferido.

Não tivesse o governo da Nova Ordem de Soeharto derrubado o governo de Soekarno e o massivo Partido Comunista PKI, a história pós-guerra da Austrália teria sido completamente diferente. Uma Indonésia dominada pelos comunistas teria sido desestabilizada e todo o Sudeste Asiático.

Então porque é que os Australianos olharam a Indonésia com tanta desconfiança especialmente no último quartel do século passado, quando é evidente que a Indonésia tem estado no fulcro da nossa estabilidade estratégica?Infelizmente, penso que a resposta é Timor-Leste e as notícias voluntariosas dos negócios Indonésios na Austrália pelos media Australianos.
Esses media têm sido, principalmente, a imprensa Fairfax e a ABC. Maist particularmente The Sydney Morning Herald e em menor extensão The Age.


Este rancor, e as deturpações do verdadeiro estado da vida económica e social da Indonésia, podem ser atribuídos à política "de ajuste de contas" dos media na Austrália pelas mortes dos Cinco de Balibo -os cinco jornalistas com base na Austrália que foram encorajados a relatar duma zona de guerra pelos proprietários irresponsáveis e que foram baleados e mortos pelos militares Indonésios em Timor-Leste.

Este evento foi disparado contra Soeharto pelos jornalista dos media impressos. Desde esse momento, aos olhos deles, Soeharto tornou-se um repressor cruel e intolerante cujo trabalho de toda a vida de salvar a Indonésia da destruição foi visto apenas através do prisma de Timor-Leste.

Raramente os jornalistas mencionaram que Soeharto foi presidente durante quase dez anos antes de fazer alguma coisa em Timor-Leste. Ele estava contente em deixar para Portugal o enclave no seu arquipélago atingido pela pobreza e negligenciado, com os seus 300 anos de hist+oria de colonização sem esperança. Soeharto tinha problemas suficientes em tirar a Indonésia da pobreza sem precisar de carregar com outra província atrazada.

Mas em meados de 1975, oficiais militares aliados a comunistas tomaram o controlo em Portugal e as suas colónias além-mar foram tomadas oficialmente por regimes Marxistas. Em Timor-Leste um grupo de esquerda, que se auto-intitulava a si próprio a Frente Revolucionária para a Libertação de Timor-Leste, ou Fretilin, encenou um golpe desencadeando uma guerra civil.
Quando a Fretilin tomou a colónia pela força, o governo de Soeharto alarmou-se. Isto aconteceu no pico da Guerra Fria. Saigão tinha caído em Abril desse ano. A Fretilin pediu ajuda à China e ao Vietname. Receando uma "Cuba à porta de casa", Soeharto decidiu com relutância pela intervenção militarn. Nos seus 33 anos como líder, não embarcou noutras conquistas "estrangeiras". E não se teria maçado com Timor, se a Fretilin não fosse tão bruta. Na verdade, José Ramos-Horta disse ao Herald em 1996 que "a imaturidade, irresponsabilidade e más decisões dos Timorenses provocaram a Indonésia a fazer o que fez". Xanana Gusmão disse ainda a toda a gente que o quis ouvir que tinha sido um "mau erro" para a Fretilin ter-se apresentado ela própria com um fato "Marxista" em 1975.


Mas nada disto parou um dedo dos jornalistas Australianos, a maioria deles do estábulo da Fairfax e da Four Corners da ABC, de noticiarem os negócios Indonésios desse tempo de tal modo que os Australianos apenas puderam ver a grande transformação económica da Indonésia e o alívio da sua pobreza e a sua tolerância, principalmente através do prisma distorcido e partido deTimor-Leste.

O Herald chegou mesmo a defender em editorial a favor duma invasão de Timor-Leste pelos Australianos, então território Indonésio. Isto é, precisamente desde essa altura o Herald urgiu o governo Australiano para invadir a Indonésia. Tão radical tem sido a Fairfax com a Indonésia e tão traidora tem sido do interesse nacional da Austrália.

Mesmo ainda esta semana, o Herald afirmou que as realizações do governo da Nova Ordem de Soeharto "foram construídas em areia", nomeando que a Indonésia tem balançado de crise em crise depois de 1998, quando o Herald sabe que Soeharto fez precisamente a coisa certa ao pedir a ajuda do Fundo Monetário Internacional e que o FMI, a operar sob prescrições do Tesouro dos USA, chutou o país e Soeharto em peças.

O declínio na Indonésia, depois de 30 anos de crescimento de 7 por cento sob Soeharto, teve pouco a ver com Soeharto e tudo a ver com a crise financeira Asiática e o FMI de vistas curtas e mal-informado.

Mas mais do que isso, os jornalistas Australianos sabiam mas falharam em comunicar com eficácia que não apenas Soeharto manteve o seu país junto como insistiu que a Indonésia fosse um Estado secular; isso é, um país muçulmano mas não um Islâmico ou fundamentalista. Noutras palavras, não um Irão.

Não pensariam que uma tal questão seria uma questão de alta e primeira importância para comunicar à comunidade Australiana? Que ao pé da nossa porta há um Estado secular Indonésio e não um religioso, dirigido pela lei Islâmica. E não dariam, com toda a razoabilidade a Soeharto todo o crédito por ter mantido aquele vasto arquipélago como mo uma sociedade civil livre do fundamentalismo?

Vejam o que nos aconteceu em Bali às mãos duma meia dúzia, literalmente uma meia dúzia de fundamentalistas Islâmicos. Imaginem o turbilhão para a Austrália se o total dos 230 milhões de Indonésios tivesse uma objecção contra nós. Mas este esgotado grupo de jornalistas Australianos sabia apenas noticiar como Soeharto era corrupto por causa do filho dele Tommy, podia abrir à força o caminho para denunciar alguns acordos dele com uma companhia de telefones Americana ou da sua filha com um construtor de estradas. Podendo ser verdadeiras essas generalizações, em termos do peso dos interesses da Austrália, as realizações da vida pública de Soeharto pesavam muito massivamente mais do que os seus negócios privados.

Acontece que conheci bastante bem Soeharto. Era esperto e totalmente decisivo e tinha uma boa opinião da Austrália. A paz e a ordem do seu país, a sua tolerância religiosa e étnica e a paz e a ordem do Sudeste Asiático veio da sua boa vontade para com os Estados seus vizinhos e da sua inteligência. Era discreto e muito tímido. Tinha que ser provocado para se abrir, mas quando começava a falar, a sua capacidade intelectual vinha ao de cima.

Soeharto viveu no que se poderia chamar na Austrália numa mansão McMansion bastante velha e pobre em Jacarta. Estive lá em várias ocasiões. Vivia simplesmente como qualquer pessoa da sua alta condição podia viver.

Mas a Time magazine afirmou que Soeharto tinha escondido uns $30 biliões, como se esses inúteis pudessem saber, presumidamente para fugir para Miami ou para as Bahamas. Disparate total. Soeharto era um Indonésio que ficaria sempre na Indonésia. Vivia uma vida simples e nunca iria mudar isso.

Não duvido que a sua família gananciosa o enganou e que se safou com grandes somas de dinheiro que não ganharam. Soeharto era um líder disciplinado mas não um pai disciplinado. Mas compará-lo como igual aos Marcos é uma infâmia.

As descrições de Soeharto como um ditador brutal a viver uma vida altamente corrupta às custas do seu povo e a dirigo«ir um regime militar expansionista não são verdadeiras. Mesmo a anexação de Timor-Leste por Soeharto não foi expansionista. Teve tudo a ver com a segurança nacional e nada com o território.

Como todos os líderes, Soeharto teve as suas falhas. A sua maior falha foi subestimar a natureza da sociedade que ele cultivara. Quando a sua liderança económica levou à suficiência alimentar, educação, saúde e declínio da mortalidade infantil, depois essas mudanças levaram ao aparecimento duma classe média quando o rendimento subiu. Soeharto devia ter deixado que a representação política subisse como subiram os rendimentos. Mas ele desconfiava das classes políticas. Ele acreditava que não iam pôr em primeiro lugar o interesse nacional, que não tinham capacidades administrativas e que eram totalmente indecisas, se não corruptas. Ele disse-me isto em várias ocasiões. Não largou as rédeas. Em parte porque não queria largá-las em parque porque não tinha ninguém a quem as dar.

O problema de Soeharto era ter pouca fé no seu próprio povo, o próprio povo de quem tanto cuidava.

Fosse qual fosse a transição política que pudesse desejar ter tido, tudo se evaporou com a crise financeira Asiática de 1997-98. Ele não tinha nenhum mecanismo de transição democrática e no caos económico, forças políticas quiseram que ele se fosse embora.

Em Janeiro de 1998, quase dois anos depois de eu ter deixado do cargo de primeiro-ministro da Austrália, voei para Jacarta por minha própria iniciativa e à minha própria custa para o ver no dia em que ele assinou o acordo com o FMI com o director do fundo, Michel Camdessus.
Tragicamente o FMI tinha exagerado em Novembro anterior e Soeharto estava a dar-lhe uma oportunidade para sair do buraco. Ele tinha uma pequena janela de oportunidade. Pensava que como antigo chefe de governo que era amigo dele, podia ao menos dar-lhe conselho do tipo que ele nunca receberia do interior da Indonésia: aproveitar a oportunidade do interregno do FMI para dizer que ele Soeharto, iria concorrer às próximas eleições mas que não completaria o mandato. Que ele ficaria o tempo suficiente para ver as reformas do FMI em lugar e que depois entregaria a presidência ao seu vice-presidente.


Tivesse ele aceite este conselho, o processo de transformação política teria sido completamente ordeiro. E uma nova administração teria montado os órgãos da democracia.

Discuti estas questões com Lee Kuan Yew e Goh Chok Tong da Singapura, dois que tinham no coração os melhores interesses de Soeharto e da Indonésia. Ambos acreditavam que eu estava numa melhor posição para levantar esta questão a Soeharto do que eles. Durante duas horas estive em casa do presidente com o seu secretário de Estado, Moerdiano, e o seu intérprete Widodo. Quinze minutos depois da conversa começar, quando fazia o caso para ele sair, ele parou a tradução de Widodo e pegou directamente o meu conselho em inglês. Moerdiano disse ao lado da porta, "Penso que o apanhou".

Soeharto seguiu-me à porta, pôs os braços à volta dos meus ombros e disse "Deus o abençõe" quando partia. Quando me virei, eu não o tinha apanhado e ele ficou a pensar que se podia safar mais uma vez.

Mas a crise e o comportamento do FMI e do Tesouro dos USA tinham-no deixado só e abandonado.

Completamente determinado a actuar conforme a constituição, ele entregou o poder, por iniciativa própria, ao seu vice-presidente para evitar qualquer levantamento do tipo que a Indonésia tinha experimentado durante as transições anteriores.

O novo presidente, B.J. Habibie, então, com toda a legalidade, apanhou as rédeas do governo para lidar com a continuação da reconstrução financeira e o longo processo da democratização.
Quando o Ministro dos Estrangeiros em exercício, Robert McClelland, e eu chegámos à Indonésia para o funeral de Soeharto na passada Segunda-feira, passámos os 30 quilómetros do aeroporto ao mausoléo em Solo onse seria enterrado ao lado da mulher. Em todos os metos desses 30 quilómetros havia pessoas presentes. Nalgumas partes em filas de seis e oito, todos com cestas com pétalas para atirar ao cortejo. Todos eles sabiam que estavam a enterrar o construtor da sua sociedade e sentiam o momento.


Quantos líderes Australianos teriam um milhão ou à volta disso de pessoas a chorar por eles à beira da estrada? O funeral de Soeharto foi uma dádiva ao que a sua vida significou de verdade. Senti-me honrado de ter estado lá, mas mais do que isso, por o ter conhecido.

Paul Keating foi primeiro-ministro da Austrália de 1991 a 1996.

NOTA DE RODAPÉ:

Vergonhoso... Esta última declaração de Paul Keating não é de um político com cultura democrática.

É de um selvagem. Um bárbaro... um idiota.

Shame on you...

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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